Árvores de Canela

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A cidade de Canela está assentada sobre uma geografia que mistura áreas de campos e de matas, vales e encostas, nascentes e banhados. Neste contexto topográfico, a urbanização incipiente e progressiva da cidade substituiu ecossistemas originais por novos, formados por ruas, calçadas, praças, prédios pequenos e grandes e um sistema de abastecimento de água e energia, entre outros. Andando pela cidade, vejo, aqui e ali, alguns representantes nativos das matas de outrora, demonstrando a força genética das espécies arbóreas da flora original, tão importantes para os primeiros madeireiros.

O cedro-rosa é um destes emblemáticos representantes. Na praça central da cidade vejo alguns exemplares de grande porte com suas sombras na primavera, verão e outono, além do calor do sol no inverno, devido à perda anual das folhas. Seus frutos são secos, portanto, não atrativos para consumo, mas servem para trabalhos artísticos nas mãos hábeis de artesões. As minúsculas sementes, dotadas de finas membranas que as tornam leves e facilmente carregadas pelos ventos, são consumidas por papagaios, fungos e insetos. A madeira avermelhada é utilizada para confecção de gamelas e móveis. Imponente, destaca-se pelo crescimento rápido e beleza de sua folhagem verde brilhante.

A araucária, outra espécie nativa, conta muito sobre o passado recente da região, quando foi explorada quase à exaustão devido à sua madeira de alta qualidade. Quando vejo uma localizada num jardim ou praça, tento fazer o caminho do pinhão que a originou. Veio de longe ou de perto? Trazida por alguma gralha ou mão humana? Impossível saber. Apenas me detenho no fato do perfeito funcionamento do sistema natural de dispersão da espécie.

O ipê-amarelo, icônico representante da mata ancestral como o cedro e a araucária, ainda resiste na zona urbanizada, imiscuindo-se pelos terrenos baldios, jardins e na praça central da cidade. Igual ao cedro, perde as folhas no inverno deixando o chão, no seu entorno, coberto por elas, parecendo uma manta protetora das raízes durante as geadas de julho.

Andando por uma rua central, encontro dois destes baluartes da mata antiga, mostrando a formação de um fragmento da floresta, representado por apenas duas espécies, lado a lado: uma araucária e um ipê-amarelo. Faço um exercício de abstração e, por minutos, retiro a calçada, a rua, os carros, caminhões, prédios e as pessoas. Logo, este dueto terrunho fica cercado por dezenas de árvores, arbustos, cipós, musgos, samambaias e uma bicharada intimamente interligada. Uma buzina estridente de caminhão me acorda do devaneio, e tudo volta ao normal. Deixo um saludo à resiliência destas duas espécies que, no meio da calçada, como dois pedestres, parecem conversar sobre as coisas do passado e do presente.

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