“Eu sou nuvem passageira, que com o vento se vai, eu sou como um cristal bonito, que se quebra quando cai…” Este é um dos versos da música “Nuvem passageira” de Hermes Aquino, um grande compositor e intérprete gaúcho dos anos 70 e 80 que conheci, pessoalmente, quando morava em Porto Alegre. Durante uma tarde desta iluminada primavera, olhei para o céu absurdamente azul e percebi nuvens isoladas em blocos disformes, muito brancas, num tranquilo passeio impulsionado pelo vento. Imediatamente a música cantou dentro da minha memória, reportando aqueles anos musicais da minha juventude onde floresceram grandes nomes da música gaúcha, como Almôndegas, depois Kleiton e Kledir e o próprio Hermes Aquino, entre tantos outros.
Nuvens me encantam, podendo ser brancas e fofas, desfilando em grupos pelo vazio do céu, convidando a ver formas mutantes de pessoas, animais e tudo o mais que a imaginação permitir; ou aquelas carrancudas e escuras, anunciadoras de tempestades, gerando espanto, apreensão e medo; ou as belas aquarelas coloridas de final ou início de dia, autoras dos quadros abstratos mais impressionantes.
Quando não há nuvens, parece que o céu está sozinho. Elas trazem aquela algazarra alegre ou criam incertezas, não permitindo que se permaneça relaxado. Tudo pode acontecer quando elas aparecem misteriosamente. Comunicam-se através do vento, parecendo gostar de se reunir mais e mais. Em algumas ocasiões, o sol, cansado da bagunça, limpa o céu, espantando-as para lugares distantes do campo de visão.
A vida é bem parecida com as nuvens. Há aqueles momentos de puro encantamento e calmaria, como as disformes bolas de algodão branco que vagam em pequenos grupos, parecendo uma família ou grupo de amigos. Nos episódios tensos de doença, discórdia ou morte, elas se mostram densas, ameaçadoras e escuras, carregadas de uma energia poderosa que podem destruir tudo pela frente. Isto reflete como as coisas se desenvolvem aqui na terra, quando os momentos de felicidade podem ser efêmeros como as formas imaginárias assumidas pelo vapor. Noutro tempo, tudo assume novos contornos. A mutabilidade das nuvens e do curso da vida é bem clara e permite pensar numa “ligação” entre ambas, sendo que a vida, tal como a conhecemos, é mais nova do que as nuvens. Daí que lhes devemos respeito e admiração, e saber ler suas mensagens subliminares. Como o fez Hermes Aquino, quando, em outro verso da mesma música, cantou: “Não adianta escrever meu nome numa pedra, pois esta pedra em pó vai se transformar…” Nada é permanente, nem a forma das nuvens, nem a rigidez da pedra, nem a magia da vida.