O gado foi introduzido no Rio Grande do Sul por volta de 1628 pelos Jesuítas lá pela Região Missioneira, bandeado do outro lado do rio Uruguai. Animais até então estranhos a paisagem, trazidos inicialmente da Europa, aqui logo foram se adaptando e ocupando espaços na vastidão dos campos que havia em mais da metade da cobertura vegetal natural do Rio Grande do Sul. Lentamente foram se multiplicando e se espalhando por onde havia pastagem, e aqui pelos Campos de Cima da Serra, no nordeste gaúcho, chegaram também com os Jesuítas quase cem anos depois, fugindo das Missões, uma vez que eram vítimas dos assaltos dos Bandeirantes paulistas que vinham prear escravos indígenas.
Logo surgiram as fazendas e estâncias de grande porte aqui na região serrana, divididas por quilômetros de taipas de pedras feitas com mãos de escravos negros e índios. Lentamente o gado foi imprimindo uma morfologia típica em alguns lugares acidentados, formados por coxilhas altas e íngremes. Estes animais tem uma tendência de se deslocarem pelas curvas de nível dos terrenos acidentados, economizando a energia que gastariam para subirem ou descerem em linha reta ou em diagonal.
Numa das fotos é possível ver o gado se deslocando pela encosta de uma coxilha alta e as marcas deixadas pelas trilhas paralelas que, vistas de longe, dão a impressão de degraus ou patamares bem nítidos ao longo da encosta. Visões semelhantes, mantidas as proporções, são as dos patamares de plantações de arroz que se veem em países orientais, como China e Tailândia. Quando a necessidade obriga, homens e animais mostram um padrão semelhante de adaptação na utilização dos terrenos adversos. Os orientais pela necessidade de terem terras planas para irrigarem o arroz e aqui os bovinos pela sabedoria de menor esforço diante de um terreno tão adverso.
Quem anda pelo campo percebe que nestes locais feitos à cascos, com a paciência bovina de anos seguidos, cria-se um caminho perfeito para o deslocamento deles e de pessoas. Profundas as vezes e cobertas pelo capim em outras, são excelentes para uma caminhada pelos costados destas altas coxilhas gramadas.
Uma vez escapei de uma situação perigosa quando caminhava pelos campos da região do cânion Fortaleza, em Cambará do Sul. Fui surpreendido com a chegada repentina de uma cerração densa que me tirou a visão e a orientação. Sentei e fiquei pensando em como voltar, já que não enxergava nem a ponta das minhas botas. Só lembrava que estava indo em direção oposta à da fazenda onde estava. Apalpei o terreno até encontrar uma destas trilhas, virei para a direção contrária e calculei que ela deveria ir até a fazenda ou próximo a ela, um caminho natural dos bovinos. Com a ponta das botas ia identificando o terreno nu e assim fui indo lentamente por mais de uma hora até chegar num local em que o nevoeiro começou a enfraquecer e me mostrou os contornos do galpão e das casas da fazenda. Fui salvo pelos caminhos do gado.