Inaugurado há 75 anos, o Aeroclube de Canela corre o risco de ter que encerrar as suas operações no Aeródromo Municipal Eris Zugno, onde atua há 32 anos. Desde 4 de setembro de 2024, o local passa por um processo para se tornar em um aeroporto com vôos comerciais regulares sob gestão da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero). O órgão federal e o Aeroclube encaminharam tratativas de regularização das atividades do clube no aeródromo por meio de uma sequência de ofícios, mas sem convergirem. Recentemente, a empresa pública federal encaminhou ofício ao Aeroclube solicitando a desocupação do hangar ocupado pelo centro de treinamento para pilotos da aviação civil, alegando falta de contrato em vigor para as operações do Aeroclube.
A Infraero também informou que passará a cobrar cerca de R$ 18 mil mensais, além de 10% do faturamento do serviço de hangaragem de aeronaves para a regularização das operações do Aeroclube no local. O valor corresponde ao uso do hangar por parte do Aeroclube, estrutura que em sua maior parte foi construída com recursos da entidade. O impasse movimentou a opinião pública, empresários e lideranças políticas que desaprovam a medida adotada pela Infraero. “O valor que estão cobrando eu asseguro que não existe hoje no Brasil nenhum aeroclube que tem capacidade financeira para arcar com esse valor. Nenhum tem. Então dizer que a Infraero não está retirando o Aeroclube, mas estão somente tentando regularizar a área cobrando tal montante é a mesma coisa que dizer, que sim, a Infraero está retirando o Aeroclube”, opina o presidente da instituição, Marcelo Mallmann Sulzbach. “Eu gostaria de enfatizar que a gente está sim dispostos a dialogar. Nós estamos sedentos por um diálogo porque até então a agente não teve chance nenhuma de dialogar. A Infraero não nos deu em nenhum momento uma oportunidade para a gente sentar e conversar”, afirma Sulzbach. Já o gerente do aeroporto de Canela, Odone Bizz, argumenta que por força legal a Infraero precisa tomar algumas ações porque considera que o Aeroclube ocupa uma área pública sob outorga da empresa pública aeroportuária. “O problema não é o Aeroclube, a presença do Aeroclube não atrapalha a operação de uma linha aérea regular. Os demais concessionários já tiveram seus contratos regularizados, mas com o Aeroclube o contrato está vencido há três anos. Não podemos renovar algo que não existe”, afirma Bizz. Segundo ele, uma reunião realizada na manhã de quinta-feira (10), com representante jurídico do centro de formação de pilotos definiu que as duas partes irão trabalhar para solucionar o impasse. “Foi uma reunião positiva. Vamos tentar achar uma brecha que possa amparar essa renovação. Vamos trabalhar a quatro mãos para resolver da melhor forma possível”, garante Bizz.
O que afirma a Infraero
Desde o recebimento da outorga do Aeroporto pela União em 4/9/2024, a Infraero, busca a regularização da referida área, assim como ocorreu com todos os concessionários do Aeroporto de Canela, ou seja – Helisul Táxi Aéreo, Revoar Táxi Aéreo, Tri Aviation (PAA) – que já estão regulares tanto contratualmente quanto financeiramente, e o Aeroclube é o único irregular. Em nota oficial, a Infraero afirma que, como empresa pública, tem uma necessidade formal que origina de um rigoroso compliance que segue normativos e legislações, que, inclusive, por vezes, são objetos de órgãos de controles.
Com contrato já vencido quando assumiu, por várias vezes tentou uma solução amigável com o Aeroclube para a regularização e não obteve sucesso, inclusive com cobrança mensal para a devida regularidade, porém, estão inadimplentes. Dada a ausência de pagamentos e considerando que a área está sendo utilizada pelo Aeroclube para hangaragem de aeronaves, inclusive com arrecadação financeira, enquanto a Infraero segue sem receber pelo uso do espaço, mandou ofício solicitando a desocupação do espaço, assim como fazem em todos os aeroportos administrados pela empresa, inclusive com a justiça dando ganho de causa para a Infraero em situações similares.
Por fim, a Infraero registra que está aberta a conversar e encontrar uma solução para a regularização contratual e financeira do Aeroclube.
Deputado federal articulou reunião

O deputado federal Pompeo de Mattos (PDT) também se manifestou a favor do Aeroclube de Canela. Em Brasília, o parlamentar intermediou um reunião com a presidência da Infraero para tratar do assunto. Em uma rede social, Pompeo destacou:
“A Infraero assumiu a gestão do aeroporto da cidade e, logo de cara, mudou o tom: passou a cobrar aluguéis altíssimos de uma entidade sem fins lucrativos, com mais de 75 anos de história na formação de pilotos e no fortalecimento da aviação civil regional. O Aeroclube não é um negócio. É patrimônio, formação, segurança e serviço público. Não pode ser tratado como invasor no espaço que ajudou a construir. Já obtive resposta oficial da presidência da Infraero e temos uma reunião pré-agendada para terça-feira, em Brasília. Vamos buscar o diálogo — mas com firmeza e responsabilidade.
A mobilização está acontecendo em todas as frentes: na Câmara Municipal de Canela, com o trabalho da vereadora Grazi, e também na Assembleia Legislativa do RS, onde se articula uma audiência pública. Queremos diálogo, não imposição. Respeito, não desocupação. Reconhecimento, não atropelo. A Infraero é uma empresa pública. E empresa pública serve ao interesse público. Expulsar o Aeroclube de Canela seria virar as costas para a história, para a formação profissional, para a aviação regional e para o Brasil real que precisa continuar voando. Vamos seguir firmes. O Aeroclube não está sozinho. Estou ao lado de quem constrói, ensina e faz a diferença.”
SECRETÁRIO DE TURISMO DEFENDE O DIÁLOGO

A pedido do Nova Época (NE), o secretário municipal de Turismo e Cultura, Rafael Carniel se manifestou sobre a disputa entre a Infraero e o Aeroclube. Em nota enviada ao NE, Carniel destaca que é necessário estabelecer diálogo entre as duas partes para que a cidade, a população e o desenvolvimento do município não sejam prejudicados por este embate. “Canela tem no Aeroclube uma história viva da aviação, e na Infraero, a promessa concreta de um futuro ainda mais conectado. Ambas as instituições demonstram compromisso com a cidade e com a comunidade. É fundamental que prevaleça o diálogo e o entendimento mútuo, pois a imagem de Canela — como destino turístico e cidade estratégica da Serra Gaúcha — é corresponsabilidade de todos”, comenta Carniel. “Quando surgem conflitos públicos, o nome da cidade é que vai à vitrine. E, nesse contexto, cada organização local carrega Canela como sobrenome. Neste sentido, o Município de Canela através da Secretaria de Turismo buscou ouvir e conectar gestores de ambas as organizações. Que possamos sempre construir juntos soluções viáveis, pautadas no diálogo, nos princípios da boa gestão e no bem comum”, concluiu o secretário.
VEREADORA GRAZI DEFENDE AEROCLUBE

A Vereadora Graziela Hoffmann PDT) saiu em defesa do Aeroclube de Canela após ameaça de despejo da Infraero . Segundo ela, a medida é injusta e ignora o valor histórico, social e comunitário do espaço. “O Aeroclube não é só uma pista de pouso. É um símbolo da nossa cidade, mantido há décadas por voluntários apaixonados pela aviação. É parte da nossa identidade”, declarou Grazi, ao lembrar da importância da instituição para a formação de jovens e para o atendimento emergencial em momentos de crise. A parlamentar contesta a versão da Infraero de que houve falta de retorno do Aeroclube nas tratativas para uma solução. Segundo Grazi, houve tentativas de diálogo por parte da entidade, mas sempre via ofícios, dificultando um acordo real. “Parece que a Infraero está apenas buscando um pretexto para retirar o Aeroclube dali. Isso não é negociação, é imposição”, critica Grazi.
Outro ponto destacado pela vereadora é o valor de R$ 18 mil cobrados pela Infraero por mês de aluguel — um montante considerado completamente incompatível com a realidade de uma instituição sem fins lucrativos, que presta serviços educacionais e comunitários sem qualquer apoio financeiro fixo. Além disso, Grazi lembrou que o Aeroclube é reconhecido como instituição de utilidade pública, o que, segundo ela, reforça a injustiça da tentativa de despejo.