Gosto de comer frutas na origem, escolhendo e arrancando de um dos ramos aquela que me agrada. Ir ao mercado e selecionar nas gôndolas as melhores, não têm o mesmo sabor e valor. Quando posso, acompanho as frutas desde sua origem nos botões florais das árvores, quando surgem junto com as novas folhas trazidas pelo sol e o calor da primavera. Um pé de goiaba-serrana brinda-me com o prazer de meses de contemplação e espera, começando já nas flores de carnudas pétalas brancas, macias e doces como uma colherada de musse.
Saboreio algumas, cuidando para não arrancar a base de onde sairá o fruto. Vejo um passarinho, conhecido como sanhaço-cinzento, também gostar deste petisco. Ele, assim como eu, respeita a flor arrancando apenas as doces pétalas, com uma maestria de dar inveja, utilizando seu bico especializado em cortar frutos e sementes. Elas são partidas uma a uma sem deixar rebarbas ou danos. A goiaba-serrana, sabendo da demora do fruto a ficar pronto, oferece uma “entrada” aos comensais através destas delícias.
Durante e após a florada, tempo de uma lua, vem a renovação das folhas. A troca é discreta e segue um plano. As velhas, por terem trabalhado o ano todo, vão amarelando e caindo, forrando o chão à espera dos fungos, minhocas e bactérias para se transformarem em um rico húmus. Simultaneamente, novas folhas vão surgindo, ramos novos vão alongando a planta e percebo, ano a ano, um aumento na altura e no volume da árvore. Logo tudo se modifica, o verde claro predomina e “sinto” a pressa da goiabeira em produzir açúcar para nutrir seus frutos, agora já como pequenas esferas presas aos ramos e ocultos pela densa folhagem, parecendo filhotes “mamando” nas tetas de uma mãe generosa.
Com a passagem de outras duas luas, os frutos, agora com o formato de uma esfera rugosa, verde e dura, começam a demonstrar, através de uma discreta mudança na coloração e na maciez sutil da casca, o seu amadurecimento. Dentro, envoltas em um creme doce e levemente ácido, estão as sementes, as verdadeiras descendentes da árvore. Escolho um, dos tantos ali dependurados, corto ao meio e me encanto com o arranjo interior. Parece tudo preparado para um banquete e as sementes, discretas, duras e pequenas, estão ali envoltas com o doce e atrativo recheio. Retiro, com uma pequena colher, o interior do fruto e saboreio o melhor da natureza. Quase cinco luas para chegar aqui, quase meio ano para o momento de saborear este misterioso gosto de uma mistura de mel, limão e uma pitada de segredos guardados pela genética da árvore.
No passar dos dias, os frutos vão se oferecendo a quem deles se interessar e, assim, outro ciclo se completa na goiabeira-serrana. Quando as luas do outono e inverno chegarem, encontrarão uma árvore exausta, mas tranquila, uma vez atingido o objetivo de recrutar a fauna e sua incrível capacidade de se locomover e dispersar suas sementes para novos lugares. Já vejo algumas folhas mudarem sua cor e fico pensando que, na alma desta preciosa árvore, o calendário para a nova estação já deve estar organizado.